“Idealmente a Terra deve estar em perigo, deve haver uma busca e um homem presente na hora mais decisiva. Tal homem deve confrontar alienígenas e criaturas exóticas. O espaço deve fluir pelos portos como vinho de um jarro. O sangue deve correr pelos degraus do palácio e as naves devem ser lançadas nas profundezas sombrias. Deve haver uma mulher mais bela que os céus, um vilão mais sombrio do que um Buraco Negro e tudo precisa dar certo no final.”
Obrigado de novo, Brian W. Aldiss! A seção Space Opera está de volta, dissecando essa lista de princípios do subgênero para jogadores e mestres de Brigada Ligeira Estelar. Já chegamos a tocar no assunto muito anteriormente, mas essa listagem é de uma conveniência enorme para explicar passo a passo como ela funciona — e depois de falarmos sobre os perigos, a busca, o homem (ou mulher) na hora e local certos e os alienígenas, nosso próximo passo é…
O ESPAÇO DEVE FLUIR PELOS PORTOS COMO VINHO DE UM JARRO.
Uma metáfora que transcende o literal. Vamos decifrá-la em três atos.
1. A Metáfora do Espaço como Vinho
Aldiss não fala de portos terrestres, mas de portos estelares — pontos de partida onde naves deslizam rumo ao desconhecido. O vinho que flui livremente da jarra evoca:
- Abundância: O espaço não é vazio, mas repleto de maravilhas e perigos.
- Dinamismo: O cenário é vivo, com saltos hiperespaciais, surpresas traiçoeiras e rotas comerciais pulsantes.
- Inebriamento: A jornada espacial deve ser tão intoxicante quanto o vinho, com sensações que desafiam os sentidos.
Pergunte-se: como tornar o espaço um personagem ativo em sua campanha?
2. O Espaço como Personagem (e não Cenário)
Na Space Opera, o vácuo não é pano de fundo, mas um antagonista ou aliado.
- Regiões Hostis: Crie “mares tempestuosos” cósmicos: uma névoa vermelha que corrói cascos de naves, forçando tripulações a buscar refúgio em faróis espaciais abandonados? Uma zona gravitacional desconhecida onde o tempo acelera, envelhecendo a tripulação em um dia por hora? Pense nas possibilidades.
- Fenômenos ainda incompreensíveis: Deixe um pouco da física de fora e pense no que ainda não pode ser explicado. Os jogadores veem “galáxias deslizando como rios de luz através das paredes translúcidas da nave” durante o hipersalto? Tem visões alucinógenas? Ou surge aquele momento no qual 2+2 não é 4?
- Beleza Mortal: Seja sensorial. Asteroides estão no caminho como se fossem enormes monolitos, o brilho mortiço de uma estrela anã pode ser a seu modo uma experiência única, há beleza ao ver as cores de uma nebulosa à distância no espaço e os personagens jogadores estão testemunhando isso com os próprios olhos.
3. Portos Espaciais: Faróis da Civilização
Assim como os portos marítimos foram centros de comércio e conflito, os espaçoportos são:
- Pontos de Conexão: Onde contrabandistas, diplomatas e caçadores de recompensa podem cruzar seu caminho, isso se não misturarem em bares com atmosfera suspeita.
- Limiares do Desconhecido: A última parada antes do “mar das estrelas” — um lugar para recrutar aliados, comprar mapas pirateados ou descobrir rumores sobre planetas perdidos.
- Fervilho Cultural: Mercados exóticos com artefatos alienígenas, arenas de combate interestelar, ou templos de cultos estranhos.
Use portos espaciais para introduzir NPCs memoráveis, como um mercador de órbitas que vende “rotas seguras” pelo Cinturão de Asteroides de um dos sistemas solares da Constelação (spoiler: nenhuma é segura).
O Espaço é um Oceano (e Você é o Capitão)
A partir disso, pensemos em tópicos: primeiro, o Espaço como um “mar cósmico”. Aldiss evoca a tradição das narrativas marítimas de aventura (como as histórias da Era dos Descobrimentos ou dos piratas), transpostas para o espaço. Assim como portos eram pontos de partida para o desconhecido nos oceanos, na space opera os portos espaciais são locais de início de jornadas onde naves partem rumo ao “mar” das estrelas. Essa analogia é bem comum, aliás.
Essa analogia não é nem apresentada de forma sutil.
Segundo: se o espaço “flui” pelos portos como vinho, há uma ideia de abundância, movimento e troca. Os portos marítimos eram locais de comércio, encontro de culturas e risco (pirataria, tempestades). Da mesma forma, portos espaciais seriam pontos de conexão caótica. Assim como os portos marítimos eram limiares entre o conhecido e o desconhecido, os portos espaciais representam a fronteira entre locais seguros e o vácuo hostil.
A frase de Aldiss nos lembra que, na Space Opera, o espaço não é estático — ele dança, desafia e surpreende. Como mestres, nosso trabalho é transformar o vácuo em um parceiro de narrativa, cheio de oportunidades para heroísmo, tragédia e descobertas que deixarão os jogadores sem fôlego. Então se perguntem: como vocês farão o espaço “fluir” em suas campanhas?
Até a próxima e divirtam-se.
DISCLAIMER: Uchuu Senkan Yamato 2199 é propriedade de Yoshinobu Nishizaki/2014 Space Battleship Yamato 2199 Production Committee e 2012 Space Battleship Yamato 2199 Production Committee; Armored Fleet Dairugger XV é propriedade de TOEI ANIMATION, Co.; Capitão Harlock e Galaxy Express 999 pertencem ao espólio de Leiji Matsumoto e à TOEI ANIMATION, Co.; Space Runaway Ideon (sim, aquela imagem espacial do topo veio de lá) pertencem à Bandai Namco Filmworks, Inc. Imagens para fins jornalísticos e divulgacionais.
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Há animes de robôs gigantes que apresentem o Espaço dessa forma? Como um “Mar do Desconhecido”?
Só me lembro do Dairugger, que é um super-robô. Eu vejo mais isso em space operas como as do Leiji Matsumoto em geral — não só Patrulha Estelar, mas Capitão Harlock também escancara muito essa comparação.
Mas existem Space Operas com robôs gigantes? Como elas costumam apresentar o espaço como personagem?
Bom, um que consegue é o Heroic Age (embora não seja bem de robôs gigantes. O ponto é que o espaço precisa ser um lugar de desconhecido, de perigos e mistérios. E isso precisa fazer parte de sua mítica.
Então BLE é o primeiro á tentar harmonizar a Space Opera com o Real Robot de maneira igualitária? Lembro de você mencionar que Brigada na real era uma *New* Space Opera.
Eu até gostaria que fosse, mas com certeza não é. Há vários exemplos dentro do gênero que puxam mais para a Space Opera. Macross Delta, Heroic Age, Vandread, todos eles podem ser classificados assim.
Tem razão. Martian Sucessor Nadesico é outro exemplo e que chegou até a passar no Brasil.
Mas ainda acho que a New Space Opera merece uma artigo ao fim dessa coluna.