Universos Alternativos (UA)

Qual a razão da existência dos universos alternativos (UAs) em uma ambientação? Bom, isso acontece quando alguma franquia acaba se tornando gigante, acumulando milhas e milhas de rodagem cronológica, começando a se alimentar de si mesma e exigindo um monte de bagagem de quem chega no meio do caminho. Às vezes, é preciso uma porta de entrada mais simples e com menos coisas a se explicar, mas com os princípios mais fundamentais do cenário mantidos.

A franquia Gundam é o nosso paradigma aqui. Eles têm uma cronologia principal, a Universal Century (UC), desde seu começo em 1979. Porém, a partir de meados dos anos 90, esse universo já tinha um bocado de séries e estava chegando em um beco sem saída nas produções posteriores (V Gundam não teve uma resposta positiva, F91 foi cancelada ainda na produção e fizeram um filme de seus restos para recuperar o investimento perdido…). A solução foi essa.

Assim, tivemos várias séries de televisão com os conceitos mais básicos de Gundam, mas usando outras abordagens de cenário no restante e renomeando os termos gerais, mesmo quando usados para significar a mesma coisa (exceto “Gundam”. Sempre há um robô gigante chamado Gundam). G Gundam*, Gundam Wing**, Gundam X***, Gundam Seed****, Gundam 00*****, Gundam Age******… todos eles mantêm traços do original, mas de resto são diferentes e fechados em si.

As várias linhas de tempo de Gundam. Achou confuso?

Gundam não foi o único. Macross II deu segmento cronológico ao longa Do You Remember Love?******* e nisso, criou uma linha de tempo com sérias diferenças em relação ao original. A série fracassou monstruosamente no Japão, levando o estúdio a abortar esse universo e voltar à velha linha de tempo — mas aqui as coisas ficam interessantes: os Estados Unidos abraçaram o cenário abandonado, expandindo-o com muita liberdade em quadrinhos e RPGs********!

Animes estão longe de serem os únicos a se valer disso. No ocidente, talvez o melhor exemplo seja a recente trilogia cinematográfica de Jornada nas Estrelas (a Kelvin Timeline*********) e, diacho, muitos espectadores jovens foram introduzidos à franquia por causa desses filmes. Do mesmo modo, a toda-poderosa série germânica de livros Perry Rhodan, na estrada desde 1961**********, ganhou seu próprio universo alternativo (Perry Rhodan NEO) em 2011.

Esse não é o Perry Rhodan dos livros de bolso do seu avô.

Agora, quando falamos de RPGs, nos quais toda ambientação é uma caixa de ferramentas para o mestre e toda bagagem é bem-vinda, qual é o sentido disso? Temos muito a desenvolver ainda! Por que dar um passo de lado e fazer um cenário alternativo, reciclando conceitos do cenário principal como se ele não tivesse nada mais a oferecer? Bom, para começar, queremos oferecer a experiência do gênero em jogo — e os AUs fazem parte do gênero, simples assim.

Mas há mais. Sempre deixei lacunas deliberadas e possibilidades abertas justamente para garantir ao mestre um bom grau de customização do cenário. Daí as Áreas Mascon, as terraformações de Luas ou o fato de o mapeamento dos mundos não-habitados da Constelação ser um tanto vago. Eu vejo os UAs como uma forma de incluir elementos narrativos que, por algum motivo ou outro, não se veem contemplados no cânon principal. Mas você pode incluí-los, assim!

Macross II: descanonizado, se tornou um terreno livre para desenvolvimento.

Metendo a Mão na Massa

Em primeiro lugar, o mais importante é definir qual é o coração comum do cenário. Sendo curto e grosso: são os robôs gigantes hussardos, a ambientação interplanetária e uma guarda chamada Brigada Ligeira Estelar — lembre-se, ela está no título e, sem um desses elementos, não estaremos mais em Brigada! A partir daí, podemos estabelecer quais dos aspectos originais do cenário permanecerão como estão e quais deles irão mudar. Pensem na sua premissa!

Imaginem, por exemplo, esse contexto: seus jogadores gostaram de Brigada, mas queriam algo mais parecido com Zeta Gundam, Gundam Wing ou Gundam 00, nos quais os personagens se uniram em uma frente de resistência contra um inimigo institucionalizado. Se fosse só por isso, eles poderiam se unir à Vanguarda Sideral, mas eles também se incomodam com os Proscritos e preferiam um inimigo mais tradicional, com faces e nomes definidos, menos misteriosos.

Crie vilões originais e… ah, deixa isso para lá…

Então vamos listar as possibilidades — e são muitas: e se a “Constelação do Sabre” fosse devastada por uma guerra cataclísmica, deixando os planetas em ruínas e a sobrevivência em condições extremas? Não existiria mais uma Aliança Imperial, mas há uma guarda independente chamada Brigada Ligeira Estelar, com o objetivo de proteger o que resta de civilização, defender quem precisa e encontrar um modo de reconstruir esses mundos. Só falta uma coisa…

O invasor. Ao invés de uma horda destruidora, temos uma mega-organização fascista que tentou cooptar a Brigada e recebeu um chega-para-lá, se tornando sua inimiga figadal. E quem a financia? Vem de outro canto, além da Constelação, disposta a trazer “democracia” caso seus jagunços falhem em dominar o lugar. Agora só precisamos mudar as contagens de tempo e nomenclaturas. Ao invés de uma constelação, que tal um… quadrante em algum ponto do espaço?

Inimigos podem ser familiares, mas não devem ser os mesmos.

Desvantagens e Vantagens

A partir daí deixamos o Calendário Estelar (CE) de Brigada e introduzimos, digamos, o Século Celeste (SC). No lugar da Constelação do Sabre, temos, digamos, o Quadrante Lambda (Λ). Crie novos mundos de acordo com sua necessidade e interesses… e pronto. Tem a desvantagem de entregar todo o trabalho de worldbuilding para as mãos do mestre, ignorando as facilidades de um cenário pronto — mas enfim, vocês quiseram seu universo alternativo. Está aí:

Pronto, agora é só colocar seus robôs gigantes para brigarem!

Viram? Não é complicado. Agora cabe ao mestre criar os mundos desse novo contexto e ele pode seguir uma linha mais livre. ESTE artigo pode ser útil caso os mestres queiram uma pequena luz sobre como podem desenvolver seus planetas mas, a bem da verdade, é possível trabalhar com elementos dos mundos oficiais de Brigada, devidamente renomeados e adaptados à nova proposta — e, melhor de tudo, o cânon oficial é feito pelos jogadores no andar do jogo.

Ou seja, se os personagens decidirem reconstruir a Confederação, ou colocar alguém no seu comando ao final de tudo, transformando a vida de todos para sempre, perfeito. Vocês podem até fazer isso no cânon oficial da Constelação do Sabre, mas muitos mestres e jogadores se sentem melindrados em virar os fatos pelo avesso. Aqui vocês não precisam ter pudor nenhum… e tenham em mente: esse UA é mera sugestão. Criem o seu!

Até a próxima e divirtam-se!

* G Gundam é essencialmente um universo Battle Shōnen com os Gundams no meio. Colônias espaciais estão lá, mas seu papel é bem diferente do apresentado no Gundam clássico.
** Gundam Wing tem um universo bem mais parecido com o do Gundam original, mas com uma inversão: aqui, o inimigo não vem das colônias espaciais, e sim da Terra.
*** Gundam X parte de um estudo de caso: se o asteroide caísse na Terra após os eventos de Char’s Counterattack, gerando um ambiente pós-apocalíptico.
**** Gundam Seed, novamente, tem um universo muito remetente ao original, mas aqui temos uma guerra entre humanos e newtypes (rebatizados de Coordinators).
***** Gundam 00 tem o universo mais remetente ao mundo real dentre as séries Gundam, com elementos desconstrutivos.
****** Gundam Age é a abordagem infanto-juvenil do cenário.
******* DYRL já é um universo alternativo em relação ao original, recriando os personagens e recontando sua história, mas em um contexto com mudanças radicais.
******** Macross II teve histórias em quadrinhos pela Viz Comics e ganhou uma linha de RPG pela Palladium Games, usando o mesmo sistema de regras do Robotech RPG.
********* Essa linha de tempo tem esse nome por conta de um incidente temporal que resultou na destruição da USS Kelvin, lá no começo do primeiro filme. O próprio Spock se dá conta de que eles são frutos de uma linha de tempo alternativa, lá pelas tantas.
********** Perry Rhodan é uma série clássica alemã de livros sci-fi de bolso, publicados internacionalmente. A quantidade de volumes é monstruosa, e ele chegou ao Brasil com sucesso nos anos 70 e 80.

DISCLAIMER: Mobile Suit Gundam e todas as suas variações pertencem à Bandai Namco Filmworks, Inc.; Superdimensional Fortress Macross II: Lovers Again pertence à Anime International Company Co., Ltd. e Big West Advertising Co., Ltd. (BWA); Perry Rhodan NEO pertence à Pabel-Moewig Verlag GmbH. Imagens para fins jornalísticos e divulgacionais.

5 comentários

  1. Então tá liberado fazer o universo de simulador de namoros escolar? :p ahauhauahuahau

    Mas sinceramente, o cenário é tão expansivo que tem espaço pra tudo sem quebrar tanto do cânone (até pra novelinha escolar).

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