Por Trás do Sabre: Asteróides Piratas

A existência de Piratas e Corsários espaciais no cenário trouxe consigo suas próprias necessidades. Não foi difícil ir longe com isso. Basta pensar nos piratas em seus tempos áureos: eles se estabeleciam em ilhas aonde criavam comunidades livres (em comparação com as pesadas normas sociais de seu tempo, na Europa) mas com suas poucas regras severamente aplicadas em nome da segurança e da convivência do local. Não se vai ao banheiro aonde se come.

Então bastou trocar as ilhas do Caribe ou cidades portuárias do norte da África por asteróides terraformados… e pronto, temos nossos piratas espaciais, atacando naves mercantes ou militares assim como seus antecessores do nosso século XVIII o faziam. Eventualmente eu quis desenvolver melhor esse elemento: basta lembrar de Belonave Supernova (nossa aventura pronta de vinte e seis sessões para o 3D&T Alpha) e da participação do Governador Tornado*.

Terraformar asteroides exigiu o seu conjunto de regras lógicas. Por exemplo, eles precisam se passar por asteróides comuns e ter dimensões grandes para abrigar pequenas cidades — além de hangares de entrada para belonaves de grande porte. Não subestimem esses pedregulhos espaciais: o asteróide responsável pela destruição dos dinossauros aparentemente tinha dez quilômetros de comprimento**. É além do suficiente para nossos piratas fazerem a festa.

Empunhe o símbolo dos ossos cruzados
e vá logo pilotar seu robô gigante!

Referências Iniciais

Curiosamente, minha primeira referência foi histórica… ou, mais especificamente, veio do livro Utopias Piratas, de Peter Lamborn Wilson (esse livro é muito bom, eu recomendo). Ele fala dos corsários da Barbária, um “não-estado” de piratas muçulmanos formado por cidades ao norte da África, e dos renegados (europeus fugidos de seu continente de origem, convertidos ao islã e à pirataria). Isso me ajudou muito a compor a ordem interna desses piratas.

Também não poderíamos esquecer do Capitão Harlock, do recentemente falecido Leiji Matsumoto — uma figura de rebeldia contra a ordem estabelecida e sua tripulação de desgarrados de todas as procedências. Meu primeiro contato com ele foi o longa My Youth in Arcadia, lançado no Brasil em VHS e exibido pela velha Rede Manchete como “Capitão Harlock e a Nave Arcádia”. Porém, ele funciona menos como pirata e mais como figura de resistência política***.

Capitão Harlock, o pirata espacial
“raiz” da animação japonesa!

Mas ao procurar referências, é fácil achá-las: embora venha com a assinatura do grande Osamu Dezaki, o anime The Legend of Moby Dick não é grande coisa****. Porém, ele funciona como uma ótima referência para esses marujos espaciais, especialmente nos pontos de parada. O mangá Crossbone Gundam***** também merece a leitura, embora a arte não ajude a vender esse peixe. E não, não vou recomendar Moretsu Pirates******. Se quiser, vá por conta e risco.

A terceira fase de Gundam Age também nos traz um pirata espacial (não vou dar spoilers sobre sua identidade, embora ela seja bem óbvia) — mas ele age mais como corsário, estabelecendo alvos dentro de um espectro inimigo. E quanto a estes em si, o mangá Mezametara Saikyou Soubi to Uchuusenmochi Datta node, Ikkodate Mezashite Youhei toshite Jiyuu ni Ikitai (arre!) serve como boa referência, apesar dos protagonistas não serem exatamente isso*******.

E como fui esquecer de Space Adventure Cobra?
Isso é obrigatório ao se falar de piratas espaciais!

Asteroides Piratas em Jogo

Mas quanto a esses asteróides em si, eles são pousos aonde os piratas fazem negócios, bebem e se divertem antes de retomar sua jornada — ou talvez até tenham uma residência, caso algum deles queira um local seguro para se abrigar. Há uma certa liberdade moral por lá e poucas cobranças, salvo o da obediência às regras de convivência. Há diversas formas de utilizá-los na sua mesa de jogo, especialmente em campanhas mais centradas no espaço sideral.

Alianças Incômodas: os personagens podem fazer uma trégua e pousar por lá sob o aval do governador local. Porém, essas alianças tendem a ser voláteis…

Base de Operações: campanhas com piratas espaciais tendem a se centrar em uma belonave — mas portos seguros podem ser úteis para nossos protagonistas.

Batalhas Espaciais: por algum motivo, é preciso atacar um desses locais… e isso sempre significa enfrentar uma monstruosa armada de piratas no espaço!

E convenhamos, seus jogadores estarão
esperando esse momento chegar…

Caça ao Covil: esses asteróides tem suas localizações protegidas pelos capitães de naves piratas… e procurar por um em especial já é uma missão em si!

Infiltração e Busca: Talvez um refém a se resgatar, um objeto a ser recuperar ou um ato de sabotagem… não importa. É preciso entrar — e sair correndo.

Space Opera: esconderijos de piratas espaciais são um clássico dentro dessa vertente e explorá-los pode render momentos marcantes para seus jogadores.

Dá para notar um ponto comum em todas essas possibilidades: sua natureza eventual. Caso seus personagens sejam piratas, eles podem até ter um refúgio mas em algum momento precisarão retornar às atividades em uma nave espacial. Se não forem, eles não tem motivos para permanecer ali por muito tempo: é um lugar de passagem ou um alvo a ser infiltrado, tomado… ou destruído. Mas é possível se demorar um pouco mais por lá, com resultados interessantes.

Os Brewers de Gundam: Iron-Blooded Orphans
São um contraponto mais realista a esse tema.

Asteroides Piratas são lugares de pressão social frouxa. Ninguém se importa quem é você ou com sua vida pessoal — e se algum chato se importar, qualquer briga ou disputa passará pela mão do Governador local. Ele é um misto de prefeito, juiz e comandante-chefe das forças de defesa locais. Ele também precisa ser bem severo: em meio a um bando de criminosos (piratas são isso, afinal), quem não impuser respeito pode terminar com uma faca na garganta.

É ele quem garante: dentro desse asteroide, ninguém toca no butim do outro. Por outro lado, tais decisões são proferidas ao sabor da vontade do governador pirata da vez e ele não se furta a ser impiedoso caso seja preciso — ou de seu interesse (se ele for esperto e isso não criar insatisfações perigosas ao seu redor, é claro). Ele precisa manter a palavra, mas sempre pode encontrar, ou forjar, alguma desculpa para se voltar contra os personagens.

O interior desses locais não deve ser nada aprazível,
assim como a colônia de Ceres em The Expanse.

Por fim, algo a dizer sobre a dinâmica entre piratas e corsários. O motivo pelo qual os primeiros odeiam tanto estes últimos é a traição: todo capitão pirata conhece rotas para vários desses asteróides terraformados em seu interior. Um corsário passa para o lado de cá da lei, praticando a pirataria apenas contra os inimigos da Aliança Imperial, podendo guardar seus tesouros em bancos de verdade… e isso põe cada localização como um alvo potencial.

É claro, os piratas espaciais também os odeiam porque tecnicamente eles passam a ser alvos para os corsários, mas o importante é: isso pode forçar a uma mudança de localização para o asteroide. Por isso, esses corpos celestes ocultam sempre propulsores em sua superfície. Então não confie em suas rotas, e se sua base pirata de operações não estiver lá quando de sua chegada… bem, acione seus contatos e vá correndo atrás.

Divirtam-se e até a próxima.

* Um animal de companhia — mas especificamente, um gorila — geneticamente engendrado para ser inteligente. No caso de Tornado, ele se tornou o governador de um grande asteroide pirata.
** A julgar pela profundidade e tamanho da cratera do local no Golfo do México. Há sinais de quedas de asteróides datados da mesma época na África, então provavelmente ele era ainda maior — mas se partiu parcialmente na atmosfera e acertou outros pontos do planeta.
*** Nessa encarnação em especial do personagem, temos mais uma alegoria da mudança de postura do povo japonês após a ocupação estadunidense subsequente ao fim da Segunda Grande Guerra.
**** Na verdade, essa série tem ideias muito boas. Mas mesmo como “Moby Dick no espaço” ela deixa a desejar.
***** Crossbone Gundam, escrita pelo próprio Yoshiyuki Tomino, dá sequência aos eventos de Gundam F91 e é focado na tripulação de uma belonave pirata espacial.
****** Moretzu Pirates é o inevitável resultado de uma força irresistível contra um objeto inamovível: a série acompanha um bando de bonitinhas meninas de mini-saia comandando uma nave pirata. O worldbuilding do cenário, em si, não é ruim. No entanto, para evitar colocar nossas fofinhas protagonistas na prática de atos criminosos, elas nos são apresentadas como… “Piratas Legalizadas”: há naves de cruzeiro autorizadas para seu ataque. Assim, elas invadem o local para trazer emoção à viagem e os itens por elas roubados serão devidamente pagos pelo seguro — isso é acertado de antemão. Em suma, elas são entertainers. Eu gostaria de saber o que as companhias de seguro acham dessa ideia imbecil.
******* Os protagonistas dessa série (não me peçam para digitar esse nome de novo, por favor!) são mercenários, não piratas espaciais.

NO TOPO: ilustração para Space Runaway Ideon. Essa série não tem absolutamente nada a ver com o tema dos piratas espaciais, mas cá entre nós… a imagem é bacana e dá todo o clima espacial para o artigo, não?

DISCLAIMER: Crossbone Gundam, Gundam: Iron-Blooded Orphans, Gundam Age e Space Runaway Ideon pertencem a Bandai Namco Filmworks, Inc.; Space Adventure Cobra é propriedade de Buichi Terasawa/A-Girl Rights e TMS Entertainment Co., Ltd.; Capitão Harlock e a Nave Arcádia e Queen Emeraldas são propriedades de Leiji Matsumoto e Toei Animation; The Expanse é propriedade intelectual de Daniel Abraham e Ty Franck, via Alcon Entertainment LLC. e Amazon Studios. Todos os personagens aqui exibidos pertencem a seus respectivos proprietários intelectuais. Imagens para fins jornalísticos e divulgacionais.

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