O que é um Couraceiro?

Como cansei de repetir, os robôs de combate em Brigada Ligeira Estelar foram inspirados na cavalaria clássica, dos tempos das guerras lutadas a cavalo. Nas tropas de Cavalaria Ligeira, os hussardos eram usados para ataques de assalto, lanceiros para ataques de carga, caçadores para missões de busca e rastreio e dragoneiros como tropas montadas de armamento leve. Mas, agora, precisamos falar da Cavalaria Pesada antes de dissecarmos os Couraceiros.

Em primeiro lugar, qual o sentido dessa divisão? Bem, a função geral da Cavalaria Ligeira como um todo era de reconhecimento, triagem e combates irregulares ou não premeditados, especialmente entre partes pequenas ou periféricas de exércitos ou frotas. Já a Cavalaria Pesada lidava com armaduras, armamento pesado, grandes cavalos de batalha… enquanto as forças ligeiras abriam caminho e varriam os inimigos, as forças pesadas eram moedoras de carne.

O conceito de Cavalaria Pesada vem da Idade Antiga: os Persas criaram a modalidade de Cavalaria conhecida como Catafractos*, com combatentes blindados da cabeça aos pés… e seus cavalos também — eles tinham armaduras próprias! Isso se tornaria padrão entre vários povos da antiguidade e, para tentar resumir o máximo possível**, chegaria à Idade Média e desembocaria na cultura da cavalaria desse período. Sim, a raiz do seu Cavaleiro de D&D veio daí!

Na cavalaria pesada, até mesmo os cavalos eram
blindados (Império Otomano, cerca de 1550).

O Couraceiro Original

Tudo permaneceu assim até 30 de Abril de 1554 graças a Pierre Terrail de Bayard — um dos grandes cavaleiros de seu tempo, com uma enorme lista de feitos, conhecido como Cavaleiro de Bayard e reverenciado como O Bom Cavaleiro sem Medo e sem Mácula***. Há onze estátuas suas espalhadas pela França.

Ele morreu em combate com um tiro de arcabuz**** e, depois disso, a ficha caiu: armas de fogo vieram para ficar e as armaduras não eram mais o suficiente.

Mas contra tiros ou não, ainda era preciso se defender das armas de corte e perfuração no campo de batalha. Para piorar, as armas da época eram muito imprecisas e era até perigoso para os próprios usuários atirar a cavalo. O jeito foi reduzir a carga: eles ainda manteriam parte da armadura, protegendo-o de lanças, flechas e espadas, mas agora usariam armamento pesado, botas de montar e passariam a carregar pistolas. Assim surgiram os Couraceiros.

Reparem como até mesmo nos capacetes eles não se afastam
de suas raízes na antiguidade. E isso é muito napoleônico…

Mesmo assim, essa primeira leva lidava com as limitações de seu tempo: como as armas de fogo eram problemáticas, os cavalos não poderiam correr, trotar ou galopar — mas podiam se mover em passos***** e, como não era preciso ter uma montaria veloz para se executar a tática de caracol******, ela se tornou o padrão de combate para as novas forças. Além disso, obter cavalos mais lentos era bem mais barato e isso facilitava a multiplicação do efetivo.

Apesar disso tudo, apenas em 1801 surgiu oficialmente o primeiro regimento de Couraceiros no exército francês, após a reorganização das forças armadas por Napoleão Bonaparte (e, não por acaso, ele sempre andava cercado por seis Couraceiros como guarda-costas). A essa altura eles já tinham tomado sua forma definitiva: a couraça cobrindo o tronco, braços livres para empunhar armas, uma carabina, duas pistolas e um sabre sem curvatura chamado latte.

Uma das últimas fotos dos Couraceiros na ativa,
pouco antes da Primeira Guerra Mundial.

Seu status também mudara: eles criaram uma mítica de força total. Como as couraças de metal eram pesadas, era preciso homens fortes e de grande porte para envergá-los. No entanto, eles acabaram desaparecendo já nos primeiros estágios da Primeira Guerra Mundial, quando ficou clara a sua inutilidade em um contexto de guerra mecanizada — e, rapidamente, foram aposentados. Mesmo assim, eles foram preservados como guardas cerimoniais em alguns países.

Curiosamente, com a mecanização das forças armadas, antigos regimentos de Couraceiros passaram a conduzir… tanques de guerra! Alguns mantiveram o nome. De certa forma, essa foi uma evolução adequada: não são os mais rápidos, mas são blindados e muito fortes, prontos para aguentar o tranco. E foram a evolução dos cavaleiros medievais! De resto é a hora de pararmos com a parte histórica de nossas inspirações e voltarmos logo à Constelação do Sabre…

As divisões de Couraceiros se converteram em batalhões de
tanques, mas as tropas de choque a cavalo ainda existem.

O Couraceiro Espacial

O conceito é até simples: couraceiros são mais lentos — eles não são uma brigada ligeira — mas compensam sendo ossos muito duros de roer. Como a ideia envolve cargas, transportar armas muito pesadas (mas destruidoras) e armaduras muito blindadas, veio a ideia de fazer dele um veículo e não exatamente uma armadura. Foi criado um mega-blindado capaz de abrigar robôs gigantes e com uma parede poderosa de canhões. E pronto, tínhamos nosso couraceiro.

A princípio foi assumida sua operação por oficiais de suporte. Porém, isso depunha um tanto contra o conceito original de Couraceiro, o último descendente da cavalaria medieval em um mundo de armas de fogo e espadas velozes. Então me veio o desenvolvimento natural: alguém precisaria cobrir esses monstrengos de metal enquanto Hussardos e Lanceiros estivessem na batalha e surgiu a ideia de grandes armaduras ao invés de robôs gigantes. Há diferença.

Já mostramos essa imagem antes, mas não custa revê-la:
das inspirações antigas aos couraceiros do futuro.

Isso nos levaria ao terreno de animes como Votoms, Appleseed e, em seus aspectos mais sóbrios, Code Geass*******. Sim, ao invés dos usuais robôs de vinte metros do cenário, eles teriam cerca de quatro metros e meio ou mais. Mas os Couraceiros antigos tinham entre suas funções a de tropa de choque e, convenhamos, essa é uma tarefa difícil de ser feita a partir de certas dimensões, especialmente em ambientes urbanos. E como eles não são os maiores…

…eles precisam ser os melhores ou morrer tentando! Assim, teríamos o Veículo Couraceiro, a Armadura Couraceira e o Oficial Couraceiro! Estes últimos continuariam usando capacetes e armaduras no tronco, deixando os braços livres, mas desta vez elas os protegeriam contra disparos. Espadas de energia, pistolas de energia e um físico mais desenvolvido: ser um Oficial Couraceiro não deveria ser para aquele protagonista padrão, e magricela, dos animes!

Os robôs da série Votoms tem menor
porte… mas
fracos? Nem um pouco!

Em suma, eles são os Fortes e Durões. E tem razões para sê-lo. O fato de estarem ligados a um veículo mais lento e a robôs menores (mas bem resistentes) não os diminui em nada. Talvez o fato de estarem ligados a atividades um tanto mais pé no chão ajude… e sim, o Regente Imperial, assim como os seus antecessores no trono imperial, também tem seis couraceiros como guarda-costas. Antagonicamente aos Hussardos, eles levam a disciplina muito a sério.

Se eu dou uma recomendação específica, é a de usar oficiais couraceiros em campanhas sobre couraceiros — eles são cavalaria mecanizada pesada, não a ligeira. Eles acompanham e dão cobertura a grandes veículos blindados e armados até os dentes. O próprio tom deles como personagens puxa um clima diferente dos nossos pilotos audazes à beira da irresponsabilidade. Mas isso é só uma recomendação. Se você pensar o contrário, vá em frente.

Até a próxima.

Quando a função é a de tropa de choque, o robô
Gloucester de Code Geass é outro bom exemplo.

* O nome vem do grego e significa algo como “fechado por todos os lados”.
** Apesar da primazia persa quanto aos Catafractos, o primeiro registro histórico de Cavalaria Pesada veio dos citas. Os sármatas os imitaram e quem os espalhou de vez foram os partas. Ela se tornou uma constante na antiguidade — se eu me detiver sobre isso, o texto ficará imenso!
*** No original, le bon chevalier sans peur et sans reproche. Talvez “mácula” não seja a melhor tradução aqui. Se algum francófono me ler, por favor me puxe a orelha se for o caso.
**** Arma longa de tiro único, comum nos séculos XV e XVI. Disparava uma bala esférica de chumbo.
***** Em equitação, “passo” é o andar mais calmo de um cavalo. Tem três subcategorias: passos calmos (as patas traseiras tocam o chão um pouco à frente do passo posterior), passo ordinário (mais curtos e elevados, tocando o chão atrás das patas dianteiras) e passo alongado (as patas traseiras tocam o chão antes das pegadas das patas dianteiras). Pode não parecer, mas é importante.
****** Ou seja, evitar contato direto com o inimigo e criar um fogo móvel contra as praças de infantaria, aproveitando a velocidade de execução da cavalaria: os couraceiros são distribuídos em várias filas; a primeira fileira, chegando ao alcance de tiro, vira à esquerda e atira no inimigo, depois fica para trás na última fileira para recarregar. As linhas a seguir repetem o procedimento.
******* Não pense nos robôs mais espetaculares, como o Lancelot Albion Zero. Isso fica para os Hussardos. Pense mais em robôs como o Gloucester (dê uma olhada no mangá Code Geass: Oz the Reflection, talvez o único mangá de Geass merecedor de atenção).

Artes dos Couraceiros Imperiais por Altair Messias.

DISCLAIMER: Code Geass e Armored Trooper Votoms pertencem à Bandai Namco Filmworks, Inc.; Imagens usadas para fins jornalísticos e divulgacionais, sem infração de direitos intelectuais.

3 comentários

  1. Dúvidas sobre os Couraceiros:

    * Eles já tem Kit para 3DeT Alpha? Se sim, o Kit tem alguma coisa que permita ao Couraceiro, sozinho ou em conjunto, reduzir o impacto de ataques ao seu veículo protegido? (se tem um personagem que mereceria algo como Ataque Especial, mas que aumente A ao invés de F, são eles .-.)

    * Além disso, alguma possibilidade de termos um NPC icônico no cenário para representar os Couraceiros?

    * Finalmente, se me lembro bem, existe uma bateria de provas para entrar na Brigada Ligeira Estelar – mas como o nome diz, ela é a Brigada LIGEIRA. Qual o processo de seleção e treinamento que leva alguém a se tornar um Couraceiro?

    * Qual o ponto de vista deles sobre os Hussardos?

    1. Vamos lá, na ordem:
      • Arquivos do Sabre, páginas 61-62. Ele tem um poder de Kit chamado “Corpo e Máquina”, aumentando sua Força e Armadura.
      • No futuro, com certeza.
      • O treinamento dos Hussardos foi inspirado no treinamento napoleônico que originou o Pentatlo. Obviamente não era o mesmo dos Couraceiros — não tem motivo para ensinar a nadar quem afundaria com aquela armadura no tronco. E eles usavam espadas bem grandes, diferente dos Hussardos. Eu imagino que o treinamento Couraceiro esteja mais próximo dos treinamentos fuzileiros, com algumas diferenças substanciais (estes não usam espadas, afinal). E quanto à seleção, eles precisam de porte físico. Um oficial couraceiro pequeno e magro? Esqueça.
      • Eles acham a atitude deles na melhor das hipóteses uma palhaçada, na pior acham uma irresponsabilidade entregar robôs de vinte metros para gente com um parafuso a menos. No geral, eles não gostam muito deles — mas precisam conviver com Hussardos, porque eles se valem muito de veículos couraceiros (especialmente em solo).

  2. Adorei o artigo. A ilustração ficou linda e é ótimo saber que teremos um cantinho onde enfiar aquele personagem mais rabugento, durão, chucro e teimoso: pilotando um Couraceiro e sendo uma pedra no caminho dos inimigos…(e dos aliados ás vezes)

Deixe uma resposta

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s